Honoré de Balzac é considerado o pai do Realismo na literatura e é conhecido pelas suas reflexões psicológicas acutilantes. A sua obra maior, a Comédia Humana, é composta pelo conjunto dos seus romances, que constituem uma extensa análise dos diversos aspetos da sociedade francesa oitocentista. Sabendo isto de antemão, a leitura deste romance de Balzac revelou-se uma profunda desilusão.
A história prende-se com Julie de Chastillon, jovem mulher apaixonada pelo seu futuro marido, Victor d'Aiglemont, um homem banalmente medíocre. O pai de Julie avisa-a contra a sua tolice, mas ela não lhe liga, uma vez que apenas o seu romance lhe interessa. Algum tempo de um casamento falhado e da descoberta da fatal verdade de que o seu pai lhe avisara, Julie desenvolve um amor platónico por Lord Arthur Grenville. Saltando novamente uns anos, vemos uma Julie de trinta anos, completamente desiludida e desamparada na sua vida, apenas os seus deveres de mãe e a pressão da sociedade a impedindo de terminar com a sua vida. Conhece nesta altura da sua vida Charles de Vandenesse, jovem diplomata com quem estabelece uma relação de confidência. Saltando ainda mais um pedaço de tempo, agora observamos histórias fatalistas que assombram a existência já miserável de Julie, para além das vidas dos restantes membros da família d'Aiglemont. Por fim, no final da sua vida, Julie reflete sobre a sua vida marcada pela dor e sobre o papel da mulher na sociedade e, acima de tudo, no casamento.
Pende sobre a narrativa um exacerbado fatalismo. Um dos piores aspetos do romance prende-se com este dramatismo fatalista que sufoca a ação dos personagens. Nenhum personagem neste romance é natural, todos agem condicionados pela fatalidade, o que confere à narrativa um desgaste prematuro. A estrutura do romance é ainda outro ponto negativo. O romance trata-se de uma manta de retalhos de episódios de si já disparatados cosidos uns aos outros para formarem o volume de um livro. Neste aspeto, os estudiosos da obra balzaquiana são unânimes, com Pierre Barbéri, escritor e crítico literário francês, catalogando este romance como "um dos pior construídos, mais indesejáveis e pior escritos" do autor, acrescentando o professor e tradutor húngaro-brasileiro Paulo Rónai que "esse conjunto de seis episódios disparatados, mal reunidos entre si e
rematados por uma conclusão melodramática, é mais apropriado a enfastiar
o leitor do que a fazê-lo procurar outras obras do romancista." Não são credenciais muito lisonjeiras para um romance. Não deixa de ser uma decisão no mínimo estranha a da coleção "Ler Faz Bem" de selecionar este de todos os outros de Balzac, claramente bem melhores para dar a conhecer o autor. Mesmo um dos pontos mais fortes de Balzac, que são as suas observações psicológicas, não se revelam neste romance, as poucas que há sendo superficiais e demasiado melodramáticas. Não é de todo um bom romance para se conhecer um autor que é descrito como um grande escritor. Fica a esperança de que obras futuras de Balzac se elevem bem acima deste nível, e que A Mulher de Trinta Anos tenha constituído uma necessidade do autor em forçar a sua publicação, mais do que vontade sua. Mas também nos deixa desconfiados das próximas obras do autor, porque Balzac historicamente viveu em constantes problemas financeiros, pelo que qualquer outra pode ter sido publicada como necessidade também. É uma péssima experiência de leitura. É deste romance que surge o termo balzaquiano associado à beleza da mulher madura, que é um pormenor insignificante mas que não deixa de ser curioso. Nem a crítica que o autor deseja fazer à imposição da sociedade à mulher de uma ditadura matrimonial inevitável consegue vingar, perdendo-se no meio da confusão fatalista da narrativa.
Portanto, uma péssima experiência de leitura que não recomendaria a ninguém. No entanto, não desistirei para já de Balzac, uma vez que ser apelidado de pai do realismo e de acutilante observador psicológico promete boas experiências de leitura nos seus pontos mais altos.
Citações:
"Desde que regressara de Touraine, a sua saúde debilitara-se cada vez mais e a vida parecia ser-lhe marcada pelo sofrimento; sofrimento elegante de resto, doença quase voluptuosa na aparência, e que podia passar aos olhos de pessoas superficiais por uma fantasia de mulher afetada."
"Uma tarde os dois enamorados estavam sós, sentados perto um do outro, contemplando uma das mais belas fases do firmamento, um destes céus puros em que os últimos raios do sol lançam cores ténues de ouro e púpura. Neste momento do dia as lentas diminuições da luz parecem despertar suaves sentimentos, as nossas paixões vibram ternamente e saboreamos as perturbações de não sei que violência depois da calma."
"A cor carregada da abóbada chegava, por insensíveis graduações, a confundir-se com a das águas azuladas, marcando o ponto de encontro por uma linha cuja claridade cintilava tão vivamente como a das estrelas."
Pontuação: 3.7/10
Gonçalo Martins de Matos
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