sábado, 7 de agosto de 2021

"A um Deus Desconhecido", de John Steinbeck

   John Steinbeck é considerado um dos gigantes da literatura norte-americana, sendo reconhecido por empregar um estilo marcadamente alegórico nas suas obras. A um Deus Desconhecido, logo pelo nome, promete esse cariz alegórico típico do autor.
   Joseph Wayne, o terceiro dos quatro filhos de John Wayne, pede a bênção do seu pai para poder emigrar e estabelecer-se no Oeste. Este concede-lha, e é assim que Joseph se estabelece no Vale de Nuestra Señora. Após a morte de John Wayne, os restantes irmãos, acompanhados das respetivas esposas e prole, mudam-se para o terreno, construindo um rancho comunitário, com Joseph como patriarca. No coração do rancho dos Wayne encontra-se um grande e velho carvalho, que Joseph acredita encarnar o espírito do seu falecido pai. Por isso mesmo, Joseph vai-se dedicando à grande árvore, o que parece resultar na prosperidade do rancho. É em Nuestra Señora que Joseph conhece Elizabeth McGregor, com quem acabaria por casar, mudando-se esta também para o rancho. No entanto, Burton Wayne, muito religioso, sente-se assustado com as crenças que o seu irmão aparenta demonstrar, pelo que, depois de o avisar repetidamente para reencontrar o caminho de Deus, decide cortar a árvore, que resulta no fim da prosperidade da quinta e numa onda de doença, seca e morte que se abate sobre o rancho. 
   Como seria de esperar, a alegoria preenche as páginas deste romance. A crença, a fé, a religião e a esperança encontram nos personagens e nos locais deste romance as suas manifestações "terrenas". Todo o ambiente do romance é dotado de um misticismo e de um certo paganismo que nos levam a refletir sobre a simbiose que deveria existir entre o Homem e a Natureza e sobre como, confrontado com uma Grandeza superior a si, o ser humano apenas consegue recear, antes de aceitar. É também aberto espaço à reflexão sobre o papel da religião na crença humana e sobre os efeitos adversos da cegueira religiosa no ambiente humano. A comunhão que Thomas, outro irmão de Joseph, e este sentem com os animais e a natureza contrasta com o fervor religioso desestabilizador que Burton exprime. Em termos descritivos, o romance contém relatos completos das paisagens do Oeste norte-americano, repletas do tique pagão que povoa as páginas do livro. 
   
Citações:
"O outono aproximava-se enevoado, tornando o céu cinzento. Enormes nuvens, fofas como algodão, corriam todos os dias do oceano e detinham-se um bocado sobre os cumes das colinas, para depois se retirarem outra vez para o mar, como navios celestes de reconhecimento."
"Começaram a cantarolar baixinho, em notas fora de compasso. O tom elevou-se.Cada vez mais vozes seguiam o ritmo. Grupos inteiros balançavam-se na apinhada pista de dança. O zumbido das vozes cresceu tornando-se profundo e vibrante, em vez dos risos e piadas gritadas iniciais (...). Os dançarinos perdiam a sua identidade. Os rostos assumiam um aspeto enlevado, os ombros descaíam-lhes ligeiramente para a frente, cada pessoa se transformava numa parte de todo um corpo dançante e a alma desse corpo era o ritmo."
"Joseph começou a recordar-se de como galopara em certa noite escura, atirando com o chapéu e a chibata para longe, para preservar um bom momento entre muitos outros. E de como estavam verdes e espessos os arbustos, debaixo das árvores, como as ervas das colinas se curvavam ao peso das sementes que continham; como os outeiros se encontravam pesadamente revestidos, parecendo raposas. Agora eram glabras; uma embaixada dos desertos do sul procurava terras para a futura expansão do império dos desertos."


Pontuação: 6.5/10


Gonçalo Martins de Matos

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